Os craques dos Biocombustíveis
// 24 abril 2009 // Pesquisas
Entre os dias 20 e 23 de Abril/2009, estive representando o Brasil num Workshop em Trieste-Itália denominado “Next Generation Biofuels and bio-based Chemicals” organizado pelo ICS (International Centre for Science) da UNIDO (United Nations Industrial Development Organization). Essa instituição visa promover o crescimento e o intercâmbio científico em prol de países em desenvolvimento ou dos países “em transição”, como atualmente considera-se o BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China). Na oportunidade, grandes empresas estavam ali representadas, notadamente diretores da ENI (empresa petrolífera italiana) e da Novozymes (empresa líder mundial na área de enzimas, de origem dinamarquesa), bem como instituições governamentais e universidades européias e americanas, além de especialistas na área de biocombustíveis dos BRICs e de países menores, porém relevantes nessa área, como a Argentina.
Interessante notar que, até agora, a crise econômica mundial não foi capaz de inibir as metas européias de redução de emissões. Pelo contrário, esses limites seguem restrições cada vez mais rígidas. Desse modo, o interesse pelos biocombustíveis segue crescendo, sobretudo pelos de 2ª geração, utilizando biomassa residuais (única opção de crescimento de produção de biocombustíveis na Europa).
Como consenso, na área de biodiesel, diversos grupos apontam ser ainda muito cedo para qualquer predição comercial de algas para biocombustíveis. De acordo com o representante africano, K. Muzee do Quênia, as experiências com jatropha no continente apresentam vários problemas como doenças desconhecidas e baixa produtividade. Portanto, além dos tradicionais colza, soja e palma, apenas as gorduras animais estão ganhando mais espaço em alguns países (algo que no Brasil já vem acontecendo há mais tempo, sobretudo após o lançamento da planta do grupo Bertin). Novos processos utilizando óleos e gorduras, apenas a hidroesterificação, estudada também na Índia e Malásia, além do Brasil. Processos de hidrotratamento como o desenvolvido pela finlandesa Neste Oil estão sim na fase comercial (como já apresentado aqui nesse espaço, no post Diesel Renovável) mas assustam ainda com um CAPEX muito elevado. Na área de glicerol, a diversidade de opções é grande (a exemplo do que ocorre no Brasil com o grupo temático de co-produtos).
Mais força ocorre com a produção de hidrogênio a partir da glicerina, em baixas temperaturas. Além do grupo de Wisconsin-EUA, grupos italianos e argentinos vêm estudando com bastante seriedade esse assunto. A expectativa é de várias plantas pilotos ainda esse ano, nesses países. Essa realmente é uma novidade interessante. Para que se tenha uma idéia, hoje, o gás natural é a principal matéria-prima para produção de hidrogênio, o que ocorre num reator catalítico a aproximadamente 900oC. Com o glicerol a produção de hidrogênio ocorre a partir de 230 oC. Uma tremenda diferença que significa um investimento muitíssimo menor. Isso é crítico no caso do hidrogênio que possui um custo caro de transporte. Com a produção a partir do glicerol, teríamos hidrogênio sendo produzido de forma descentralizada, pelo processo de reforma em fase líquida. Isso permitiria o uso de hidrogênio em processos de transformação de bio-intermediários, ou seja, derivados de açúcares, óleos, gorduras, entre outros, que são produzidos em localidades distantes dos atuais centros de produção de hidrogênio (basicamente, as refinarias da Petrobrás). Assim, por exemplo, poderíamos ter solventes, lubrificantes, cosméticos, tensoativos, tintas, aditivos alimentícios, produzidos de forma mais competitiva no interior do país. Hoje, muitos desses insumos químicos derivados de açúcares e óleos são importados! Normalmente vêm de países que importam nossas matérias-primas e as transforma em produtos de mais alto valor agregado, e lógico, nos revende a preços mais elevados. Um dos gargalos (não o único) seria assim diminuído ao prover fontes baratas de hidrogênio (a rigor, bio-hidrogênio) de forma mais descentralizada.
Na área de etanol, o representante da Novozymes disse que não crê em alguma planta industrial de etanol a partir de material lignino-celulósico antes de 2011. Apesar de várias experiências exitosas em plantas pilotos, todos esperam pela primeira planta industrial capaz de transformar qualquer bagaço, palha, cavaco ou outra biomassa residual em álcool. Essa empresa escandinava, que possui instalações em Curitiba-PR, publicamente diz apostar muito no Brasil. Não apenas no setor de biocombustíveis, mas na produção de vários intermediários químicos de alto valor agregado utilizando enzimas e outros bio-catalisadores.
A comunidade científica e as empresas presentes também observam com muito ceticismo o anúncio de algumas tecnologias mais ousadas, utilizando organismos geneticamente modificados e aptos para transformar açúcares em hidrocarbonetos. Apesar de respeitar os renomados pesquisadores envolvidos nessas empresas de “venture capital” a maioria ainda paga para ver.
Outro fato interessante é que está em curso um edital na Europa para projetos especificamente entre países da União Européia e o Brasil. O tema: “Segunda Geração de Biocombustíveis”, quatro milhões de euros para pesquisa (veja aqui o edital). Nada mal. Na prática, vários grupos europeus estão “caçando” grupos brasileiros para submeter projetos conjuntos. A data final de envio de projetos é dia 5 de Maio.
Realmente, se algum pesquisador brasileiro está com problemas de auto-estima, passe a se envolver com os biocombustíveis… Verás que os estrangeiros até esquecem de nos perguntar por Ronaldinho, Ronaldo e Robinho como costuma ser praxe. O país do futebol é mesmo visto como “time grande” nos biocombustíveis.
Além da chamada para esses projetos, o próprio ICS-UNIDO montou um laboratório de modelagem molecular e de reações experimentais em Trieste. Nesse momento estão oferecendo seis bolsas para jovens que possuam mestrado ou doutorado na área de catálise e síntese de biocombustíveis (bolsa de 1.800 euros/mês, seguro e passagens). O período de permanência é de seis a oito meses. Se o jovem possui cinco anos de experiência e doutorado, o valor da bolsa passa para de 2.500 a 3.000 euros mensais (mesmo período de seis a oito meses). Em ambos os casos, o inglês é requerido. O meu amigo Prof Walkimar Carneiro da UFF passou um período de seis meses no ano passado. Atualmente, o Prof. Alex Taranto da Universidade Estadual de Feira de Santana-BA acabou de chegar para ficar seis meses nesse centro. Maiores informações no site www.ics.trieste.it ou diretamente com Susanna Prata (prata@ics.trieste.it). Sim, após conversa com os diretores da UNIDO posso dizer que os brasileiros (e nossos hermanos argentinos) levam preferência nessa escolha dos “Ronaldinhos e Robinhos dos Biocombustíveis”.
Prezado,
Suas palavras são precisas e apontam claramente o norte. A espontaneidade e ‘garra’ quanto ao tema evidenciam desprendimento, clareza, consciência e importância da ‘missão’ a cumprir. Parabéns e sucesso.
Caro mestre,
Obrigado pelo seu excelente relato do evento.
Gostaria de aproveitar esse espaço para informar a todos e em especial ao pessoal de NOVOZYMES, que nosso grupo de pesquisa aqui no Mestrado de Bioenergia da FTC tem conseguido resultados interessantes na etanólise de Triacilgliceróis por enzimas de sua fabricação inclusive sem o auxílio de co-solventes. Todo apoio no sentido de acelerarmos esse resultado será muito bem vindo.
Frederico Silva
Prezados Senhores,
Gostaria de me cadastrar no BIODIESELBR.
Atenciosamente,
Prof. Mauro C. L. Souza
COPPE/UFRJ