Biodiesel Verde-Amarelo
// 01 abril 2009 // Biodiesel, Usinas
Que o Brasil é uma referência mundial na produção de etanol, destilando mais de 20 bilhões de litros/ano de álcool de cana, todos sabem. A pluralidade de ser uma referência nos biocombustíveis (e não apenas no álcool) já é mais recente. De fato, o mundo se espanta ao ver que, em apenas três anos, a produção brasileira de biodiesel passou de zero a quase 3 bilhões de litros/ano de capacidade instalada (ANP).
Ao ver esse cenário, algum desavisado seria capaz de jurar que o biodiesel produzido no país faz uso da rota etílica. Ledo engano, com raras e honrosas exceções. A maior delas, sem dúvida, a Fertibom, em Catanduva (SP). Primeira fábrica de biodiesel no Estado de São Paulo, inaugurada em 2005, hoje produzindo mais de 150 mil litros/dia de biodiesel. Sempre de etanol, hora com soja, hora com sebo, de acordo com as opções do mercado. Sim, biodiesel etílico de sebo, algo que muitos consideravam impossível. Além de vencer esse desafio, o biodiesel etílico de sebo possui um CFPP (ponto de entupimento a frio) em torno de 7oC, ou seja, cinco ou seis graus abaixo do biodiesel metílico. O mesmo vale para o biodiesel etílico de soja, que alcança tipicamente -6oC de CFPP, ou seja, o biodiesel etílico realmente facilita o manuseio do biodiesel no frio.
Não adoto as críticas que se faz ao metanol como um insumo muito perigoso ou venenoso. Na verdade, uma indústria química não é uma indústria alimentícia. Os profissionais da química são treinados para lidar com insumos perigosos e inflamáveis. O que beira o absurdo é transportar metanol (que em parte é importado) por mais de dois mil quilômetros para o interior do Mato Grosso, bem ao lado de usinas de etanol. Mais grave, de acordo com o site da empresa Methanex, o preço médio de referência (sem impostos e frete) em 2008 foi de US$ 624/t, contra US$ 510/t do etanol anidro nas mesmas condições (Unica).
Lógico que não se trata de uma mera escolha, mas sim de limitação tecnológica. O processo de transesterificação por catálise homogênea só ocorre utilizando- se excesso de álcool. Esse excesso tem que ser recuperado no final do processo. Ambos, metanol e etanol, absorvem toda a umidade presente nos óleos, gorduras e no catalisador. A remoção dessa água do etanol é que é bem mais difícil do que no caso do metanol. O etanol forma um azeótropo com a água (é como se 4% de água misturada a 96% de etanol formassem um só composto). Mesmo o etanol anidro possui cerca de 7.000 ppm de água contra 100 a 200 ppm no metanol. Essa água faz toda a diferença. Promove mais sabões, dificultando a separação biodiesel/ glicerina.
Produzir biodiesel com um álcool renovável, produto 100% nacional, mas com grandes dificuldades técnicas, deveria receber algum tipo de compensação ou benefício. Se culturas como a mamona e a palma recebem vantagens fiscais por seu caráter social, o etanol é socioambientalmente muito superior ao seu rival derivado de gás natural. Pois, por incrível que pareça, o ICMS pago pelo etanol é superior ao do metanol. Em São Paulo estamos falando de 18% contra 12%. Quem conhece as planilhas financeiras do custo de produção de biodiesel sabe que poucos centavos podem viabilizar ou afundar uma empresa.
Num momento em que o CNPq/MCT recém promoveu, em tempo recorde, um edital para desenvolver a rota etílica, contemplando 20 projetos, seria muito salutar se o Comitê do Biodiesel estimulasse o uso do etanol na produção do biodiesel, corrigindo essa distorção fiscal e mesmo desonerando aqueles que fazem a opção pelo biodiesel verde-amarelo.
Donato Aranda
Biodiesel de sebo também já fiz… Minha dúvida é até que teor de ácidos graxos livres ele é viável, já que a esterificação tem de ser repetida várias vezes para que o nível de %ffa razoável seja atingido.Ou temos de fazer refino químico para os níveis mais altos de acidez?
oleosgorduras@yahoo.com.br
O biodiesel etílico é, na realidade, “o biocombustível” mais ao nosso alcance atualmente. A despeito ,de um modo geral, de não termos muitos problemas relacionados com CFPP por conta da nossa característica climática, a ideia de integrar a produção de etanol ao biodiesel tem evidência e viabilidade econômica quando se vê o exemplo da empresa de catanduva, próxima de usina de etanol. Isso tambem resolve o balanço energético da unidade integrada, pois, se for necessário lançar mão do refino físico no intuito de ajustar a alta acidez de alguma matéria-prima, ou até mesmo de utilizar-se de outra rota que não a clássica transesterificação por catálise básica mas que requer mais energia, temos o bagaço como fonte energética bem mais em conta na geração dessas utilidades.
Professor Donato,
Gostaria, primeiramente, de parabenizá-lo por mais um excelente trabalho. Vejo este blog como um valioso recurso para o estudo de biocombustíveis, principalmente no que diz respeito a temas atuais e polêmicos.
Aproveito a oportunidade para levantar algumas questões relacionadas a produção de biodiesel através da rota etílica. Nesse processo, há dificuldades quanto à recuperação do etanol e à purificação do biodiesel. Jé existem respostas para esses problenas?
Além disso, o álcool etílico é mais caro que o metílico. Isso não acarreta um aumento nos custos de produção do biodiesel?
Por fim, há algum tipo de incentivo fiscal para um aumento de produção do biodiesel, assim como existe para o álcool que é misturado à gasolina?
O etanol não deslancha no Brasil pelo simples motivo que economicamente não é viável frente ao metanol. Ponto.
É possível e desejável alterar esta situação, ou seja, fazer com que o etanol custe menos para produzir a mesma quantidade de biodiesel. Mas para isso vai ser preciso empenho do governo incentivando as pesquisas e estimular o uso do etanol.
Quem disse que o Etanol não é viável??? Já fiz muito biodiesel com Etanol anidro,(não em laboratório) com a conversão em etil ésteres de 98% Apesar da diferença em preço, outros pontos devem ser manipulados para que se obtenha um biodiesel de ótima qualidade.